Dos concertos deste semestre passado, houve um momento onde parecemos estar revivendo as antigas polêmicas modernistas, dos anos vinte e trinta, e o incômodo da ultra-vanguarda dos anos sessenta. O Concerto de Câmara de julho trouxe, sob a regência de Wagner Polintchuk, o “Choros nº3, Pica-Pau”, de Villa Lobos.
Esta é uma daquelas pequenas obras-primas que explicam porque Villa se destaca tanto em relação a outros compositores brasileiros. Em pouco menos de quatro minutos de música, com um conjunto pouco usual - vozes masculinas e instrumentos de sopro, incluindo um Sax alto - Villa mostra que conhecia profundamente a sua profissão. A obra é deliciosa, utilizando um motivo indígena sem cair em nacionalismos piegas e com um leve toque humorístico.
O inesperado foi o fato desta composição, da década de trinta, ainda causar um certo estranhamento no público, que fica entre o impacto agradável da obra e a desconfiança de que aquilo é uma espécie de brincadeira. Fica claro que a obra permanece atualíssima.
Encerrando o concerto estava a “persephalia” de Xenakis. A obra foi composta para ser executada em uma Arena romana nas ruínas de Pesépolis (no Irã). Seis “ilhas” de percussões ficam dispostas em círculo, envolvendo o público. A música se desenvolve explorando as possibilidades dessa “espacialidade”. Em muitos momentos há uma dessincronia proposital, quando os percusionistas tocam seguindo pulsos diferendes, o que cria, pouco a pouco uma defazagem entre eles.
Na Sala São Paulo, poltronas foram retiradas de alguns pontos da platéia para que os instrumentos fossem posicionados, tentando reproduzir o aspecto espacial da obra. O público ficou entre o perplexo e o incomodado, mas ainda assim somente duas pessoas se retiraram antes que a música terminasse. Em uma execução dentro de uma sala de concertos o aspecto espacial da obra não aparece totalmente, ficamos apenas com uma impressão do efeito pretendido pelo compositor.
Nos dias seguintes a obra de Xenaquis foi comentadíssima no fórum da comunidade “osesp” do orkut. Percebia-se o estranhamento geral que uma peça desse tipo causa, aluns reclamavam, não sem razão, do volume altíssimo produzido pelos instrumentos, a ponto de causar dor nos ouvidos (mais um problema decorrente do confinamento da obra a uma sala de concertos).
Mas niguém percebeu a verdadeira importância do evento. Não falo do espaço dado às vanguardas de quarenta anos atrás mas ao fato de que dentro da OSESP cada vez mais vemos um espaço aberto a seus músicos para que eles se expressem diretamente. A OSESP está indo além da proposta tradicional do “maestro e sua orquestra”. Este ano já tivemos ( e ainda teremos mais) Vivaldi dirigido pelo spalla Emanuelle Baldini e este concerto de câmara dirigido pelo trombonista Wagner Polintchuk. “Pesephalia” foi uma empreitada dos percussionistas da OSESP liderados por Ricardo Bologna, que conseguiram literalmente desmontar a Sala de Concertos para promover um autêntico “happening” dos anos sessenta na Sala São Paulo.
Isso faz com possamos entrever o vasto universo que existe dentro de uma orquestra e isso é algo que poucos maestros têm a coragem e a grandeza de permitir.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Um comentário:
blz Fabio? muito bom seu blog!! sou o Gustavo amigo do Odorico, gostei muito do seu blog!! abração...
Postar um comentário