quinta-feira, março 29, 2007

devaneios estético-filosóficos...

No primeiro concerto deste ano, um programa com duas obras não muito conhecidas: “Les Noces” de Igor Stravinsky e “Catulli Carmina” de Carl Orff.
Stravinsky está entre os grandes compositores do século passado e é talvez um dos maiores responsáveis por criar algo que até hoje é capaz de soar contemporâneo, isso quando estamos a poucos anos de ver a “Sagração da Primeavera” completar 100 anos.
Já Carl Orff é conhecido pelo hit “Carmina Burana” e ficamos por aí. Alguém poderá se lembrar também que ele foi responsável por criar um método de musicalização utilizado até hoje, mas no campo da composição, desafio alguém a se lembrar de outra obra conhecida do autor.
Então, cá estavam unidos em um mesmo programa “Les Noces” e “Catulli Carmina”. A primeira é mais uma das muitas e geniais obras criadas para os “Ballets Russes” de Sergei Diaglev. A peça foi escrita originalmente para grande orquestra, mas Stravinsky considerou como versão definitiva a que ele fez anos depois para quatro pianos e percussão.
Já o “Catulli Carmina” é uma daquelas sequências que nunca deveriam ter sido feitas. Pois parece que a obra é isso mesmo. Dado o grande sucesso de “Carmina Burana” o autor resolveu que a fórmula podia ser repetida sem grande esforço para mais um sucesso. Só que, não sei porque, ele resolveu pegar emprestada a intrumentação utilizada por Stravinsky em “Les Noces” e ainda por cima resolveu que a parte central da obra, uma peça dentro da peça, poderia se sustentar sobre um coro a capela e monólogos do tenor solista.
É claro que eu não sou um admirador da obra de Carl Orff e provavelmente esteja sendo um pouco intolerante, mas o fato é que diante da riqueza estrutural de “Les Noces”, “Catulli Carmina” parece ser algo rizível de tão pobre.
Mas, não é que “Les Noces” foi aplaudida friamente enquanto “Catulli Carmina” recebeu aplausos cheios de entusiasmo. É claro que se considerarmos o critério de que quanto mais decibéis temos no final da obra, maiores e mais sonoros serão os aplausos, não poderíamos esperar outra coisa.
Mas há algo mais nisso. Seria muito fácil dizer agora que nossas platéias ainda são muito ignorantes e são facilmente seduzidas por um final grandiloquente e que isso jamais aconteceria na Europa e bla, bla, bla... Mas, talvez a riqueza estrutural de “Les Noces” seja algo mais belo no “papel”, ou seja, algo que intelectualmente é inegavelmente belo. Quem for capaz de perceber esta estrutura tão bem urdida acontecer ao longo de uma execução terá um grande prazer estético nisso. Mas esse prazer é em grande parte intermediado pela premissa intelectual. Em contrapartida “Catulli”, que, como já disse, chega a ser rizível como estrutura e, portanto não desperta esse prazer mais intelectual, “Catulli” vai direto na pele. Ritmos fáceis, ostinatos, melodias simples e facilmente memorizáveis, um enredo simples de se acompanhar. Afinal, que mal há nisso?

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